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Em inspirações

Ele

(Foto: Reprodução/ Tumblr)
Ele era do tipo sensível. Que gostava de demonstrar seus sentimentos, que percorriam um longo caminho de lá da sua alma, passavam pelo coração (que só de abraçar eu já sentia bater forte) e saiam pela boca: Eu te amo. Trouxe consigo uma rosa vermelha e uma canção que eu ouvia de sua boca enquanto caminhava em minha direção.
Eu te amo. E amei muito mesmo. Era só um sonho, prefiro dizer a mim mesma, mas será que um sonho, por si só, foi capaz de me abalar por inteiro, fazer todo esse estrago e arrancar de mim os suspiros mais profundos? De madrugada, eu imaginava sua voz, nós dois conversando. Estava louca? Não, eu o ouvia como se estivesse ali comigo. 
- Ciao, amore mio!- sua grave voz me acalentava, acalmava minha cabeça que, habitualmente, sofria com pensamentos longos e fluorescentes 'madrugadescos' que não me deixavam virar para o lado e sonhar. Então, eu finalmente consegui dormir. Não! Lá estava você, como quem não quer nada, perambulando em meus caminhos noturnos, meu corpo descansava, mas a minha mente por culpa sua. Porque virou palco pra você. Mas você fez questão de me puxar para cima , enquanto as cortinas estavam abertas, e me tornou a sua protagonista. Você era o meu protagonista. Temos, então, nossa perfeita cena de amor. 
 Suas bochechas rosadas e cabelo dourado. Vai, era um cabelo cor de chocolate, mas com reflexos que faziam dele um dourado mais quente. Os olhos eram como um anil (ou azul royal profundo?- eu insistia em perguntar). 
"Não me deixa cair", eu falava e só conseguia rir enquanto você me carregava debaixo do céu prateado que anunciava o pé d'água que estava para cair. Naquela tarde só havia você, eu e a chuva. Achávamos que o sol iria deixar que fizéssemos nosso piquenique. Que nada! ele se escondeu um pouco para que pudéssemos apreciar um ao outro durante aquele banho de chuva. Não ficamos doentes, ainda bem. Mas se tivéssemos, estaríamos ali para cuidar um do outro.
(Foto: Reprodução/ Tumblr)
Você foi meu sonho, foi sim. Posso não lembrar dos meus sonhos triviais todos os dias, minha mente inquieta me traz outras idéias e os deixo de lado. Você é do tipo de sonho que vem, me acalma e toma posse da minha memória, do qual faço questão de lembrar e levar comigo mesmo que o tempo passe. Os sonhos que tenho e não gosto, sua maior parte faço o descarte, para poder ter mais sonhos com você, como você. Iguais a você. Onde sei que vai estar. Você é meu sonho, bambino mio.
Meu coração ainda guarda aquele livro em branco que me deste para anotar todos aqueles verbetes italianos que enchiam e deliciavam meu ouvido quanto aquele gelatto que tomamos juntos, que derretia em minha boca enquanto eu te encarava e ficava com rubor.
"Mio cuore por ti bate". Acho que foi isso que te disse, soou horrível e você riu. Fiquei vermelha de vergonha, mas fui compensada com beijos no rosto. E na boca. Que beijo.
Gelato de morango, era o gosto. Você disse que meu rosto estava quente, tanto quanto seu corpo, e me chamou de boba. Disse que, se dependesse de você, eu estaria fluente em italiano em pouco tempo, mas seu desejo era que eu demorasse tempo para aprender. "Quero fugir com você para Roma, lá ficaremos juntos até o fim- e você aprende a falar italiano". Seu sotaque só deixou a proposta mais tentadora. Naquela noite, dançamos sob a luz da lua enquanto voltávamos para nossas casas.
Não, você foi sozinho. Com sua família, teve de ir. Itália e não tive tempo de entender o que acontecia para poder me despedir. Ainda não captei o porquê, você foi, não pensou na saudade que ia deixar e a esqueceu aqui junto comigo.
Podia ter deixado uma foto, uma possibilidade de contato. Ao menos uma carta com sua linda caligrafia e seu perfume. Ou aquele casaco seu que eu amava. Ou aquela sua camisa que vesti no dia que dormi em sua casa- e que impregnou seu perfume em mim para sempre. Talvez, você pensou, 70 anos não o suficiente para passarmos juntos e eternizar um amor. Saudade é mais fácil: ela vem, bate na porta e deixa lembrança entrar, como um carteiro que entrega a correspondência todos os dias.
Agora eu acordo todos os dias e digo a mi mesma: foi um sonho, apenas. Nada mais. Se é para ser memória, posso tratar como um sonho de única noite. Descalço, vou até a varanda, olho a paisagem, avisto aquela montanha. O gelatto de morango, limão siciliano, baunilha ou seja lá do que for, não terão o mesmo sabor, jamais. Que correr pelo campo e tomar banho de chuva me deixarão tremendo de frio- porque você não estará lá para me aquecer de novo. Que talvez não sejamos mais nós. Que não era pra ser.
Se eu dormir de novo, você aparecerá em algum dos meus sonhos? Espero que sim. A gente combina, mata a saudade e você me ensina a parlar italiano. Não, você aparecerá quando sentir vontade, quando a saudade apertar mesmo- mais do que já faz. Vai aparecer, me fazer sentir arrepios de novo e partir sem data. Ciao, amore mio. A cena perfeita que fizemos nenhum filme hollywoodiano será capaz de reproduzir igual. Nada será mais igual. E nada está realmente acabado. 
 




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